terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Vi....

Vi os olhos da lua numa noite sem lua; e


os dedos do sol num dia sem sol. Vi o seu

desenho inscrito nas nuvens do crepúsculo:

o rosto cego da lua, os braços apagados do

sol. Levei os dedos do sol aos olhos da lua,

e abri-os: num movimento de pálpebras,

o dia fez-se noite. E adivinhei a cor dos

teus olhos de lua com os meus dedos de sol.



Esperei por ti na confluência das nuvens

do poente. Vi-as descerem até ao mar com

seus ventres carregados de água; e vi o

dorso do mar subir até elas numa rebentação

de maré cheia. Ouvi o mar e o céu juntarem-se

num gemido de amor; e tapei os ouvidos ao

grito do orgasmo celeste, com o sangue da tarde.



Enganei-me nos caminhos que me levavam

ao céu; troquei as voltas que me traziam

ao mar. Sentei-me contigo na terra da noite,

sem lua nem sol; e o teu rosto de pálpebras

fechadas trouxe-me o sol, para que te abrisse

os olhos com os seus dedos de fogo. Entrei

no seu doce subterrâneo, longe da lua e do sol.



A tarde demorou-me nos teus braços,

até essa noite que encheu de sol os meus

dedos, e de luar os teus olhos.



Nuno Júdice

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